A alegria deste senhor ao mostrar-me os vários trabalhos que tinha feito ao longo do último mês no centro de convívio que frequentava.
O tempo era escasso, já estava atrasada para o domicílio seguinte, mas a persistência para me mostrar o que ainda conseguia fazer, muito para lá do "óbvio" que se encontra nas imagens, era enorme!
Pedi-lhe para fotografar os trabalhos, e quem sabe um dia, poder partilhá-los para mais pessoas verem. A partir daí, tirou as capas dos trabalhos de anos anteriores do armário da cozinha e ninguém o parava. Nem mesmo a dor aguda no pé da qual tanto se queixava.
No entanto, lá tive de adiar a mostra dos diversos trabalhos para uma próxima visita, que infelizmente, nunca se veio a realizar por motivos alheios à nossa vontade...
O ano de 2020 foi um ano muito exigente para todos nós.
Para mim, enquanto mulher, mãe e enfermeira senti que foi ultra_exigente!
De forma a conseguir dar resposta em "várias frentes" da minha vida, optei por dedicar-me a tempo inteiro à prestação de cuidados de enfermagem no domicílio, quer a título particular, quer integrada em equipas multidisciplinares em diferentes instituições. Desta forma - pensava eu na altura - conseguiria ter mais tempo para a minha família e para as exigências da minha profissão, especialmente nas circunstâncias pandémicas que nos encontrávamos.
Na altura, e em parte, foi uma escolha difícil porque estava numa fase de consolidação profissional nos serviços de internamento que integrava, sendo que, gostava bastante do que estava fazer, e pela primeira vez, a ter a oportunidade de integrar dois serviços diferentes dentro da minha área de especialidade. Contudo, tendo a minha família como a minha primeira prioridade, senti que não havia escolha e que prestar cuidados no domicílio a tempo inteiro face às propostas que tive, poderia ser uma boa opção.
Após dez anos de enfermagem, e oito exclusivamente em internamento, esta, foi uma grande transição na minha vida profissional. Mas sabes que mais? Foi uma grande e agradável surpresa para mim também!
Descobri que há uma carência enorme de prestação de cuidados de enfermagem no domicílio e uma literacia em saúde tão deficitária que coisas tão simples como aquelas que são tão básicas (para nós, profissionais de saúde) e que realizamos todos os dias em contexto de internamento, estão a anos-luz da realidade de muitas pessoas com as quais tenho contactado.
Há medida que o tempo foi passando o gosto e a motivação pelo trabalho que realizo no domicílio foi escalando significativamente, sendo visível o impacto enorme que tem, cada vez mais, em termos de ganhos de saúde para os utentes e respetivas famílias (assim como para a minha equipa de trabalho) haver um enfermeiro numa instituição que se possa focar nesta área.
Têm sido tantas as experiências, peripécias, questões e desafios que se têm colocado no meu caminho, que tem sido crescente a vontade de partilhá-las num blogue.
E assim surge este espaço. Um dia estava no carro, a caminho da casa de um utente, estaciono, saio do carro e dirijo-me a casa do senhor, bato à porta, e eis que o cuidador abre e diz: "Aqui está a nossa enfermeira, a enfermeira que vai a casa daqueles que precisam e trás alguma alegria e esperança na sua mala (...)". Sim, foi um reconhecimento que não esquecerei. Mas para além disso, algures após aquele domicílio, aquela expressão ficou em lupo na minha mente. Lembrei-me que a mesma daria um bom nome para este espaço que já há tanto tempo queria fundar. Não só pelo nome/expressão, mas pelo significado que tinha. Um significado que também gostava de puder transmitir neste espaço a quem aqui passar.
E para quem gostava de saber um pouco mais sobre mim/sobre o meu percurso... chamo-me Soraia! Sou enfermeira e sou especialista em saúde mental e psiquiatria, pós-graduada em reabilitação psicossocial em saúde mental e enfermagem geriátrica e gerontológica. Adoro estudar, refletir e implementar novos projetos, compreender quais as reais necessidades das pessoas e conseguir dar-lhes uma resposta qualificada no âmbito da saúde. Já tive experiências curriculares e profissionais em diversos contextos mas aquelas que mais gostei foram as relacionadas com a área das demências, cuidados paliativos, saúde mental perinatal/primeira infância, psiquiatria, pedopsiquiatria, neurologia e medicina. Atualmente, estou a ter a oportunidade de trabalhar maioritariamente no domicilio dos utentes, quer a título particular, quer através de uma IPSS onde trabalho a tempo inteiro e onde desenvolvo intervenções de enfermagem gerais e na minha área de especialidade.
E já agora, também és enfermeiro e vais a casa das pessoas prestar cuidados?
Partilha as tuas experiências no blogue também. Acredito que somos cada vez mais a prestar cuidados neste contexto.